24 janeiro 2011

tenha dó

nem me digas onde

supostamente vais

se não pretendes voltar

até amanhã


tenha dó

de mim

você não tira lasca


somente eu

te entendo

e te saco até de

olhos fechados

quando acordas suado

sonhando

com ela


tenha dó

a mim você não engana

há outra em nossa cama

e até sei quando sonhas

bem acordado

e vai ao céu

perdido na mansidão anil

daquele olhar infantil

e a tristeza te invade

rapaz

e não me podes

explicar

nada mais

desligar o

mal me quer

e ficar

tão leve

se me escreve

se me nota

se me sorri de volta

sou tão ditosa e


te saco até de

de olhos fechados

quando acordas suado

sonhando com ela

sonhando com ela


19 janeiro 2011

assim ela já vai

os dois se mediram sorrindo ela apressava o foco lá atrás como se a paisagem importasse. ou estivesse realmente perdida. olha estático, procura o que nela poderia estar perdido. e além do mais, não possuem certeza sobre quem são, embora sejam exatamente os mesmos rostos de antigamente.

será ela mesmo? por um segundo mais se olham, sorriem e então se entregam à fatalidade;

oi! mas como é que você tá?
linda!
ah...brigada, sorri amarelo. você também tá diferente.


diferente é o braço não dado a torcer.
inegavelmente estavam mais belos, a pele melhorada como se houvessem se livrado de um espinho fino e penetrante cravado nos pulmões. o rosto iluminado de ambos os lábios não mais se comprimiam para conter uma fúria aqui outra acolá, a língua soltousse em delícias e precisões e se tornou incapaz de insinceridades. os músculos, finalmente, relaxam e as fendas profundas dos olhos adquiriram tranquilidade. até os cabelos ganharam viço.

porque lhes acometeu a febre do prazer de não mais partilhar pequenos sórtilégios cotidianos. delitos tão mesquinhos que ia escurecendo a auréa de ambos. e assistiam de mãos dadas e muita parcialidade o declíno as suas íntimas espectativas. viam ruir as mais tenras perspectivas. poderiam ter-se estabilizado, poderiam ter engordado e se tornado mais sonsos, mas incessantemente procuravam alçar voo juntos como um par de gaivotas desaparecendo no horizonte do mar. só que cada uma acreditava saber melhor onde encontrar a maior dardinha prateada.


e isso cansa.


de que adianta ser tão profundo se ninguém vai até lá trazer à tona o brilho que você esconde, se não fazem mais questão de resgatar a pérola torta no oco da sua concha brilhante? melhor se arreganhar ao mundo. botar fora os dentes e as tripas. e seu grito de guerra será um colorido riso de menino, como um delicado e úmido arco-íris.

o cabelo dela cresceu castanho. ele deixou a barba afofar pacífica no rosto moreno. a gente se fala, se cruza, se separa, repara, pra quê? muito ao contrário do que era agorinha no banheiro esmurrando o porta-sabonete vazio, ela sorria tranquila.

e aí, o que você tem feito?

eu? estou fazendo sucesso. vou me babar de gabar e dizer que eu alcancei a fama, mas ela atropelou meus passos está me arrastando pelo pescoço na estrada de pedra e poeria e eu tossindo terra para a platéia aplaudir.

assim, algo aqui algo ali. e você? foco nela, foco.
estou bem. na-morando no canadá.

que merda você pode fazer no canadá? catalogar as tonalidades do gelo? fuja comigo para a argentina, garota. sempre te disse isso. bamos conhecer latinos de sangue fluído e quente, doce feito vinho. bamos beber litros da vida, sugar-lhe até a única gota que restar.

ah, que ótimo. e seu projeto?
que projeto? ela sempre tinha um. algum. qualquer um, porra

aquele seu...
ah, tenho novos projetos agora! meu deus, como o tempo passa...

então a deixei melancólica. ficamos calados por uns instantes tentando encontrar um novo elo. detesto quando fica assim, sem auto-confiança, opaca. acabo indo pro buraquinho junto dela então ficamos tímidos nos esgueirando pelos canto como dois grãos de poeria. mas depois logo seu olhar se iluminou como o mais belo raio sol na puríssima neve da montanha.

estou escalando! vamos montar um grupo no canadá tem muitas montanhas. faço parte de um grupo de adoção e proteção aos animais de rua também.

ah. quanta iniciativa. mas é incapaz de lavar a louça, incapaz de recolher suas roupas íntimas sujas pela casa, isso ela não é capaz de fazer. snowboard, sim, louça, não. além disso, eu sempre cozinhei e a cozinha sempre foi impecável e isso não faz a mínima diferença porque ela deve ter três cozinheiras e sete empregadas agora. sempre dizia isso.

como se adivinhasse o que penso ela olha a aliança. sei que olha, sei que percebe que eu estou sozinho. deixa o dedo dela enorme, o anel. uma nuvem gorda passa pelo sol o clima arrefesse. é dela a idéia de continuar falando.

continua cantando?
e seguindo a canção, senhorita. digo, senhora. ela fica perturbada, acha que não irei desejá-la nunca mais porque usa um anel feio no dedo.
é sério. parou de tocar?
vale punheta? ela cora.


onde está a merda da felicidade?

escuto um barulho irritante e surdo, como uma vibração vindo de sua bolsa.

uuu, onde será que deixei meu celular? fucinha na bolsa. parece aflita. igualzinho antes. fuça por horas e não encontra jamais o que procura, revira tudo. quando para de vibrar ela encontra o aparelho e vê a chamada perdida, suspira.

então, preciso ir.
jura? não pode...
posso.


seus olhos verdes acendem me encaram daquele jeito. maldita. um olho cego vagueia procurando por um. quantas. e seu olhar me leva de novo praquele ponto em que eu a amo e a odeio ao mesmo tempo em que ela a vejo indo embora com uma tonelada de roupas, cds -os meus preferidos, os nossos livros. e eu não corro atrás dela. eu quero, eu sou um puro suor frio na testa, respirar dói, mas nem limite máximo de uma humilhação seria capaz de retrocedê-la sequer em um passo.

será que ainda escuta nossas musicas? deve ter queimado tudo num ritual de despacho, aposto. no dia do casamento. saiu tão só, tão pequena comparada a enormidade de malas, carregava o mundo nos ombros magros. tão só, sem mágoas... sem mágoas o caralho. levei séculos pra cicatrizar. um dia na praia, até então não tinha entendido, ela ronronava o sol ia se pondo alaranjado, vermelho, dourado eu esfregava seu rosto de leopardo em minha barba, ela parou e disse por debaixo dos óculos: a solidão é só minha. nasceu e morrerá em mim. amém.

tá morando aqui, então?
é, siempre. pés no chão é a única coisa que me ajuda andar.
eu prefiro o voo, pedro.

claro, desde que alguém pague as milhas pra você curtir seu sonho adolescente irrealizável. pode fazer arte medíocre e se sentir menos torta, menos morta, menos mortal, mas os hormônios mexem com ela. as mulheres são biologicamente programadas para a infelicidade, talvez porque sejam as responsáveis pela perpetuação da espécie.

anda fazendo o quê?
eu... faço velas artesanais. vendo no calcação.
tá brincando, pedro.
sério.
então abandonou a música?

por que será que se preocupa tanto com isso?

estou namorando a madona. isso conta?
todo mundo com menos de 23 anos tem chances com ela.
não importa o sexo.
o sexo é a única coisa que importa.


e sua mãe aquela doida?
ah, faz séculos que não falo com ela.
desde então?
ela me prejudicou muito...
ah, que é isso! mãe é mãe. esses dias, aliás, eu a encontrei na rua ela fez que não me viu, não me reconheceu.
aquela vaca. bora mudar de assunto. então...
ei, garçom, dois sucos de laranja.
com vódica.

voltou a beber?
nunca parei, andré.
meu nome é pedro.
ah, é. me dá um cigarro. eu não tinha reparado, ela emagreu muito. parecia menor, mais contida em si mesma, fisicamente. mas algo nela a fazia expandir e acho que era a trêmula ondulação do seu olhar e os gestos mais amplos e relaxados. ela mexeu por alguns segundos na bolsa e localizou seu maço.

ao riscar o fósforo seus dedos tremiam. chupou seu cigarro lentamente, degustando e distinguindo cada sabor.

voltou a fumar, então. suas mãos pequenas jamais deixaram de tremer. trêmulas e frias como um filhote de pardal no inverno. fumava com muita elegância e calma, seu cigarro poderia durar dias a fio.

eu segurava suas mãozinhas achando graça. tremo por nós, dizia. por mim, pelo futuro escuro em cima do muro. tremo pela realidade a se desintegrar diante dos meus olhos pretos. ela entreabriu os lábios, enormes, vermelhos. a fumaça saia lentamente enquanto seu olhar verde-psicina lançava fagulhas em minha palha seca. e como se oferecesse a alma, um beijo:

aceita um trago?
parei de fumar, marilia.
porra, andré, meu nome é angela.
desculpa, vocês são tão iguais...

18 janeiro 2011

Dormingo

a toalha branquinha cheiro de

ferro morno em sabão de coco

as fibras

macias


os pratos todos limpos

os copos com água ou

refrigerante


a família mastiga

mórbida tarde de domingo

sem intervalos

sua imprecavida faca voa em direção

aos olhos

sonolentos

do cachorro

acorda


cruza as pernas tensa tensa tensa

descruza segura o fôlego

e goza.


ninguém a vê

bochechas rosas exceto

aqueles silentes olhos

do cachorro cheira seu garfo

cheira suas pernas

escorre um fiapo

de suor entre

a família devora

mórbida carne de

pescoço.

17 janeiro 2011

Shiva

a noite nos olhos
brilhando de estrela até apagar
a vida o calor
azul menino
hare

o vulto dos vudus
zunindo nas senzalas
macia a massaroca
da índia

as ervas de cheiro
afeitam veludo das
rendas portuguesas


os povos são todos
de terra
de mãos e pés
de carne

seca
enquanto retiravam cacos de vidro
de dentro dos meus olhos
estou morto
o chicote estala nas costas do meu
cavalo há muitas vidas
quantas
pedindo esmola
o menino azul
de fome

faz crescer
vermes
na barriga

04 janeiro 2011

como se

fecha os olhos
como se
avoa
sse.

o estomago vago há muitos dias. de fome, de pele. a pele que me reveste é meu primerio indício

os fones sempre ouvidos e baterias que duram pra sempre a música tece toda a constituição física da bolha nos meus dedos raspando na calçada.

toda pressa, as pedras do calçamento. toda pressão que o ar exerce sobre os gritos de assalto tem algo a ver comigo. nada tem mais brilho que meus dentes sorrindo são maiores que o sol porque dentro da minha boca é escuro pra minha língua pois meus dentes cobrem o mundo.

depois sou tomado de alegrias que não condizem. quero ir embora mas perdi o trem.

meus olhos não se fecham o ombro não perde a tensão. poderia a qualquer momento achar que o mundo havia enlouquecido mas eu sou o mundo. sou a humanidade fétida e afetiva que caça e consola. a força suprema que meu corpo faz para des-montar engrenagens. sobrevivo feito uma dávida, não há tempo para felicidades, contra-tempos. não hei de temer a morte, temerás somente teu medo.

a delicada flor da pele aberta às possibilidades do frio e se me riscaressem essa fina película, essa capa de pele? o líquido morno que então carrego dentro se escorreria pelas ruas feito chuva. enxurrada de mole mim seria eu coisa sem definição sem contorno em forma de

sorriso assim seco de saliva pode-se até secar o riso.

subir como um balão tamanho calor em meus pés escalpelados pelo calçamento. as alegrias vão também louvando licenças sem sentido algum, sem que os fatos confiram. os policiais vigiam o normal. abanam moscas e mendigos.

a música induz sentimentos, sim. mas não seré o contrário? a primavera entre os dentes e a bolha que a qualquer momento pode estourar seus miolos, seria doce libertação. sentado em pose de lótus recordando as vidas anteriores, sentindo a paz dos sentidos plenos- mas não ajuda a me achar, perdo na escuridão do olho cerrado, recuso-me abrir o coração acelerado sem causas definidoas, sou feliz sem medir consequencias e estrepo, até os pés nos espinhos da flor de cactus.

questão de acreditar então o peito oprimido pequeno dentro do mundo abrigava essa cidade pobre e cheia de co-incidências. abriga um universo escuro, misterioso, cheio de estrelas que insistem. sim, insistem.

como se
alguém chama
sse constantemente seu nome íntimo.
como se
as cores também
fossem da matéria láctea das
vias
como se
nossa pele fosse como só
o sol poderia
linda
morena como só
a natureza
desenhar

01 janeiro 2011

contato uspiano com a chuva:

Nunca mais os dias de chuva serão os mesmos, pois eram os teus cabelos que pingavam molhados e nas ruas vazias da tarde - em meu mundo tão ordenadamente caótico- só havia nós dois diluídos em aquarela.

na lente do teu óculo, minúsculas gotas de água refletiam a luz -que só poderia vir de nós pois o céu era um denso veludo púmbleo. E me sorrisiu tímido com covinhas nas bochechas.

Estávamos perdidos, procurando os outros seres humanos, mas meus passos eram como passos de um baile sem máscaras, de alvíssimas melodias sutis. E eu sei, escondia um rosto bonito por baixo de todo aquele cabelo e, eu sei, da indiferença nesse olhar tão negro.

Ah, os dias de chuva! O nosso dia de chuva entre tantos outros dias de lágrimas prismáticas dos olhos azuis do céu. Delírio onírico, momento vão. O poeta em transe... Foi quando tive a coragem suprema de dizer, dizer tudo. O que toda timidez pode confirmar é sua legítima consiciência do ridículo.

Dito tudo, ele então, desapareceu; como o orvalho frio se evapora nas manhãs de sol. Só restou-me esperar que a lilás flor do estio brotasse na Pedra inerte e, desta forma, pudesse reencontrá-lo, Pedro, encarnado no beija-flor.


Ida

recolhendo as roupas do chão, acende um cigarro. sai passos de passarinha
pisando leve quase asas. amanhece o rosto de quem não dormiu.

escuto o bico do seu sapato. tic-tac no asfalto.

não me movo. deixo-me estar ainda com sono como pode levantar-se tão energeticamente cedo?

acolhido no canto da chuva rala rompida apenas pela aceleração do carro que se mistura a um nó

na garganta

lá fora à espera

espermática

dela o próximo cara, o outro.

os tantos outros que

hão de vir.

Só me resta ruminar o vago prazer deixado por seu beijo amargo desejo de ter seus seios novamente em minhas mãos.


Minha

suporto.

da sua boca

pequena

um filete de sangue
fluiu
em mim
no breve beijo...

que me deste

E as carícias que

nunca te fiz

ainda ardem nas pontas dos meus dedos,

guardo-as bem secretas

de ti. toquei teu rosto

como se tocasse

um talo de flor.

Quero-te tanto

usada, suada

sorrindo sem desejo

desajeitada

mas nunca estás comigo

estás sempre mais longe

e mesmo atada às minhas mãos

és distante

não és minha

não és nada.

poesias antigas I



A cor do teu sorriso

é escandalosamente

escarlate


porque não te por na cama para dormir

seria absurdo

tuas garrinhas
e cheiro de chá

na pele

por que não brincar

de te rodar

no ar me apegar
escorrido em você toda

boca de licor

de framboesas?


a saudade doce

impregnada
nas parede do meu quarto,
em minha pele...

tu és a parte
a arte
de ser

estrela

desenhada no céu

viva pra ti vai

vibrar amarelada

sorrir

dentro do

teu olhar

como faíscas

que teus olhos pretos

soltam