A nau frágil da flor flutua
na mesma poça d’água
escura há séculos secam
-se as pétalas como
um corte cego seca
na mão.
29 novembro 2007
21 novembro 2007
Calabouço da esperança
Abro a cortina dos olhos sólidas pestanas de luz do mundo invisível surgem cores e sobretons de matéria de que já não sou feito do que era, antes, encho minha estante de apêndices ainda mais solitários e durmo sobre as certezas do travesseiro que se acumulam nos criados-mudos. criado-mudo com livros.
Pesada lápide dos meus cúmulos: não importa estar desperto ou infeliz não há diferença alguma nas sensações que filtro e invento para me tornar alguém mais parecido comigo
mesmo tendo de retomar expressões fixas e, doravante, bonitas:
assombra não ser arte nem cru só uma inocência amarela brilhando na janela dos outros apartamentos o silêncio geral do domingo.
A água escorre fria sobre o peixe na bacia. o sol alcança as primeiras flores lá fora em contraste com as sombras nas paredes igualmente opacas formando geometrias possíveis sombras de gatos que se movem sorrateiros.
a água escorre pelo desenho dos seus lábios. é da cor do invisível.
Posso me justificar, poderia fazer isso a vida toda. Seria apenas um detalhe sujo na manga da camisa ou um grão de poeira no escuro, inclusive, esqueço recados sem aquele amadorismo pomposo de lágrimas contidas.
Apenas triste e inadequado mas não acuso objeto algum ou ser vivo algum da angustia pontiangústica de existir com todas as forças cegas da natureza, da madrugada, ou seja, ela esvoaçando em mim, flor de cereja, de lembrança em lembrança a grandiloqüência patética dos sabonetes de argila ou o áspero dos uniformes militares lavados à máquina, por donas de casa que não verão seus filhos retornarem e talvez no asfalto preto de uma noite qualquer vislumbre o seu rosto e seu cheiro brilhando na chuva em gotas alaranjadas de luz.
Recuso-me entender. Sonho dez vezes ao dia e poderia saborear os detalhes mínimos se ao menos dormisse, cubro-me de nuanças delicadas que se desintegram ao primeiro toque límpido de consciência fracionada assim, como a vida, sonho nas superfícies instáveis dos prazeres rápidos prazeres completamente expressos pelo clown depressivo e egoísta que sou. a forjar seus pequenos frascos de encantar pessoas como sabem fabricar pós mágicos, as fadas horrendas do noir...
Pesada lápide dos meus cúmulos: não importa estar desperto ou infeliz não há diferença alguma nas sensações que filtro e invento para me tornar alguém mais parecido comigo
mesmo tendo de retomar expressões fixas e, doravante, bonitas:
assombra não ser arte nem cru só uma inocência amarela brilhando na janela dos outros apartamentos o silêncio geral do domingo.
A água escorre fria sobre o peixe na bacia. o sol alcança as primeiras flores lá fora em contraste com as sombras nas paredes igualmente opacas formando geometrias possíveis sombras de gatos que se movem sorrateiros.
a água escorre pelo desenho dos seus lábios. é da cor do invisível.
Posso me justificar, poderia fazer isso a vida toda. Seria apenas um detalhe sujo na manga da camisa ou um grão de poeira no escuro, inclusive, esqueço recados sem aquele amadorismo pomposo de lágrimas contidas.
Apenas triste e inadequado mas não acuso objeto algum ou ser vivo algum da angustia pontiangústica de existir com todas as forças cegas da natureza, da madrugada, ou seja, ela esvoaçando em mim, flor de cereja, de lembrança em lembrança a grandiloqüência patética dos sabonetes de argila ou o áspero dos uniformes militares lavados à máquina, por donas de casa que não verão seus filhos retornarem e talvez no asfalto preto de uma noite qualquer vislumbre o seu rosto e seu cheiro brilhando na chuva em gotas alaranjadas de luz.
Recuso-me entender. Sonho dez vezes ao dia e poderia saborear os detalhes mínimos se ao menos dormisse, cubro-me de nuanças delicadas que se desintegram ao primeiro toque límpido de consciência fracionada assim, como a vida, sonho nas superfícies instáveis dos prazeres rápidos prazeres completamente expressos pelo clown depressivo e egoísta que sou. a forjar seus pequenos frascos de encantar pessoas como sabem fabricar pós mágicos, as fadas horrendas do noir...
16 novembro 2007
Pêra
Mordê-la sumo
sugar-lhe a polpa branca
por dentro:
alvo silêncio
e sua delicadíssima pele
com um cabo preto cravado
os dentes
a primeira mordida,
em água doce,
a gente
nunca esquece
a melhor pausa
do dia é
parar
para
deliciar-me na
tua pêra
madura
sugar-lhe a polpa branca
por dentro:
alvo silêncio
e sua delicadíssima pele
com um cabo preto cravado
os dentes
a primeira mordida,
em água doce,
a gente
nunca esquece
a melhor pausa
do dia é
parar
para
deliciar-me na
tua pêra
madura
13 novembro 2007
Frutas tropicais
A pinha
Há mais de uma semana doente que sua mãe só fazia sopa e ele nem saia mais pra brincar lá fora. Até da escola sentia falta pegou nos cadernos pra rabiscar e viu que fez a mãe mais alta de todos na casa era sempre frio e pesado feito chumbo seu pai bebia e crescia barba e tinha medo de que ele não saísse mais pra trabalhar quando tinha que buscar pão na padaria ia alegre na lama até o asfalto trazer leite e uma garrafa de pinga.
Sua irmã tinha uns olhos de fome que não cabiam na cara parecia que ia sugar sua mãe inteira. às vezes tinha raiva dela que só sabia chorar leite egoísta e tremer de frio com aqueles enormes olhos pretos. Não demora, Pedro, que vai chover, a mãe disse.
Voltando distraído, pesando pedras em vários tons de terra e observava as folhas recém-nascidas e como seu nariz respirava molhado aquele dia caminhava bobo e feliz.
O chuvisco frio e fraco como sua irmã Pedro parou quando viu pé de pinha. Abarrancou no mais sequinho a sacola de pão e o leite. Foi apanhando cuidadoso só as mais macias.
De repente o tempo fechou as mãos até não agüentar mais encheu a camisa, orgulhoso de levar mais do que podia além de pão, leite e pinga. Primeiro o trovão, alto, como se deus gritasse com ele o raio fulminante pé d´água daqueles que não se escapa. Foi num tiro chovendo o mundo, encharcando a lama, a pinha, o pé, o pão e a pinga Pedro tropeçou e só ia se atolando, as pinhas despencavam na lama do caminho.
Cadê esse menino que não vem? quando conseguiu voltar, trêmulo e encharcado a cinta do pai lhe esperava o pão havia virado papa e a pinga uma garrafa quebrada e vazia. Deixa o menino, a mãe dizia assim ele pega resfriado, vá tomar banho quente, meu filho.
Mas o pai com olhos de diabo mandou Pedro tirar a roupa e nu apanhou até lhe sangrar os gritos da mãe dizendo pára e os olhos da irmã arregalados esgoelando suas últimas forças, sem pão e sem leite. A barriga da família vazia e Pedro de castigo no quarto, igual um bichicho ferido, desejando morte e vingança e depois não desejando nada. O coração batia estraçalhado as costas cheia de feridas que iam amarelando com tempo até secarem cicatrizes na cozinha o cheiro de cebola frita da sopa que Pedro não comeria.
Frutas Tropicais
As pintangas
Era feriado gordo, lerdo, cheio de moscas pousando em volta. Janaína, ou Ina, como era conhecida nos becos e bocas bocejou seu bafo de moça no cangote da mulher com quem dormira na noite sabe-se-lá qual, chacoalhou a morena, chupou pitanga com café preto. E foi só pingar no estômago, devolveu até as bagas. Contorcendo-se de nojo na privada, expulsando o café ainda fumegante nas narinas, na boca cheia d’água mole e quente.
A outra acordou meio o-que-é-que-eu-tô-fazendo-aqui? e foi encontrando suas roupas, uma saia lilás e duas pulseiras, a blusa, onde é que botei minha blusa? Janaína disse pra ela dar o fora bem rapidinho, bem rápido, que ia é botar fogo naquele cabelo falso de piranha, cheio de alisante e secador. Quando a outra se mandou, sem saber porque, começou a chorar. Passou logo, foi retocar o rímel.
Janaína não tinha fome nem o que comer, então ia cheirar mais um pouco. Geladeira. Iogurte estragado, pitangas velhas e a garrafa d’água vazia toda embaçada de frio por fora. Pensou em sair, dava sonolência e um desânimo tão grande que devia mesmo ter quebrado a cara da outra, algum móvel, um vaso, mas estavam todos espatifados cacos no chão. Cheirou mais um pouquinho e, claro, Babetty chegou no mesmo instante, entrando sem bater. Sentiu o cheiro do veneno, veado? veio voando! Loura tingidíssima, da rua, da vida, super-nem-aí-ó-que-te-mato. Ótima. Escancarou os dentes amarelos. Que cara, heim, Ina? Ah, vá te foder.
Faturou ontem não, meu bem? E queria um pouquinho também, adorava um pózinho básico. Foi falando sem parar: meu sonho, Ina, é cuspirem na minha cara e espalhar dez gramas, deixar minha cara branca que nem a tua tá agora, depois passarem a língua, nariz, me lambusarem toda de língua, pó e cuspe. não te disse? achei a sandália que é minha vida! vamos fazer comprinhas, que tu anima, mulher! que cara!
Ina explodiu, entediada. Vá pra puta que te pariu, bicha, cheira teu pó de merda e some com teu cu daqui. E ficou ali pasmada, roendo as unhas, descascando o rosa cintilante delas, enquanto a porta batia desaforada estourando tímpanos. Em seguida, abriu outra vez, a loura ofegante e sorriso rasgado na boca rachada: ah, esqueci, biscate, vim aqui te dizer que tua biba morreu. Foi semana passada, enterraram o diabo e ligaram em casa pra avisar. E a porta bateu forte, desta vez, triunfante.
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