18 maio 2011

ciranda

de súbito ria
uma boca de lobo
a engolir criança

a pele morena me arranha os olhos

como o sol
arranha o voo do pássaro
no silente topo da montanha
ele pita fumo sossegado
fiado em seu orixá


um pé antílope
esmaga a areia dourada do deserto
de súbito venta tempestade
quando ele vem
sem rumo
e chega
ao peito da selva
aberto de tiro e furo de lança
sangue
e fogo
nos animais
crepitam
as árvores uivam
uma dor de fumaça
vai do nariz à alma

e por pura coincidência
meu brinco é da cor
do teu
patuá
e tua mão morena enlaça
a minha mão branca
e a gente brinca
de rodar

16 maio 2011

Negrume

quando teu punhal de prata rasgar o imbigo da lua

cairão negros anjos de estrelas
suaves na noite dura

asas de maripousarão

no coração pulsante de pecado e vida
oferecer-se-á
escandalosamente aberta
às tocaias
(aos aromas)
do amor

e há de escorrer na tua boca
o delicioso mel de minhas
pétalas

e os anjos
flutuarão em tuas veias
roçando suas asas leves
nos ossos nus
das suas costas

15 maio 2011

Doriana

lá vai ana mergulhar no céu
tocar as nuvens
com a ponta
dos cílios

o que dói em ana são as horas desmedidas
cinzas de outros povos
sopradas em ampulheta do deserto
arrastando-se nas cocovas do camelo

ao pó voltarás...

o pôr-do-sol tinge o cristalino d´água
de lisases vermelhos alaranjado-fogo
tudo dentro
dos olhos de ana

e fora dos olhos dela num reflexo
curvo


sua dor é dor de pré-vida
não teme a morte
mas a dor de carne
e ossos que seu espírito sente
ao retornar à matéria
o leopardo preso
nos olhos de ana mira o imenso lago


dentro e fora um reflexo
onduloso de sol morno quando vai embora
tão mais doce
suave
sol quando se vai lá no alto

no céu
ana mergulha os cílios o nariz o rosto as coxas
macias os seios no azul líquido
do pôr-do-sol

nua no lago ana ria
tão rica
ria sua
riqueza plena
de não possuir nada
além do
corpo
em carne viva

10 maio 2011

violências

teus ombros baixos
são escombros
de desencontros
hábeis os teus cílios mais curtos e ainda mais finos
que os meus
lábios


espero-te com sorriso
de caber mundo
mas não caibo
nem no sorriso que não avisas quando passa
nem no oblíquo do teu olhar enviesado


ombros murchos
como violetas
que receberam muita água
excessivo amor de apodrecer raízes

podre pequena e murcha
espero que a secura dos teus passos
finquem dentro de mim
abrindo a pique
estradas intra
venosas
sem
fim