04 dezembro 2015

noite insone


já que o sono some
na velocidade do seu nome

estou aqui lendo as entrelinhas dos seus supostos olhos
famintos,
infinitos...

olhos verdes, olhos negros
que nada poderia ser mais amor que este resto amargo
de licor
que sai da sua carne

não durmo
não duro muito tempo em pé
pensando em um hipotético você

recostado atrás do meu
cigarro
as dúvidas são as únicas que resistem
com as pálpebras arregaladas
observando o Nada
absurdo da madrugada

mais um cigarro na sacada
e volto enfim a cair
em minha própria emboscada

06 novembro 2015

ainda sou o que perdi

meu tempo, 
meus óculos,
meus horários
amizades,
os cartões do banco
o lugar da fila
o telefone
daquele moço...
tal qual carrara que se esculpe
retirando-se o excesso
cai de mim todo um bloco de desculpas esfarrapadas
desabam
sacolas de pão e frutas
rolam pela rua
enquanto fico me perguntando
se realmente
o moço da padaria
me deu
o troco
errado...

Tânia e o espelho

Tânia mira o espelho
espreita os olhos
passa lápis de cor preta
em volta dos cílios
uma massa de rímel
deixa seus lábios mais vermelhos
e as bochechas coradas, batom, blush
é uma sombra com brilho...
Tânia disfarça as espinhas
com pós e máscaras
e quando está quase perfeita:
Tânia deita de porre (na cama)
e dorme.
E o espelho fica sem entender nada.

conto erótico #1


Sandra andava muito ocupada com as crianças e há alguns dias não penteava mesmo os cabelos e os seus pelos cresciam em seu corpo lenta e livremente, de fato. Passou a mão em seu queixo e o sentiu sujo de papinha de neném seca, desceu seus dedos pelo pescoço, de olhos fechados, o calor da sala misturado à bagunça da casa fez suas pernas ferverem, apertou com força os próprios seios túrgidos de leite, ainda, enfiou dois dedos desvencilhando-se do vestido do pano úmido da calcinha. O bebê chorava baixinho de fome no berço, enquanto ela termina, arrumou os cabelos, lavou o rosto. Olhou-se no espelho e sorriu, calma, com uma tranquilidade mansa e um amor por sua vida inconfundíveis.

Planos para o fim do mundo


amor io-iô
dedo dentro do maiô amarelo
que a onda do mar
salgue leve
o sal da pele
salte e espere cheiro de água de peixe
cheio de água de coco na boca
balanço de rede
debaixo da sombra e acima da sombra,
o Sol

A foice da fome

Em São Félix do Xingu (PA) trombei com um urubu
o abutre me disse
que urubu não come alpiste 
isso muito me intrigou
o que come pássaro tão nobre, então?
como o teu nome
teu endereço
teu telefone...


12 agosto 2015


a mulher amanheceu
de sua noite
intranquila
rompeu fibras
cardíacas
sentiu que
a manhã seria mais limpa
não haveria a dor nem o sangue não
haveria mais
as nuvens
seriam de algodão


eles não ficarão ofendidos
caso o prazer se espalhe
no piso
ou no chão
de todas as casas
nas quais
iremos coroar
uma nova rainha
do lar
uma rainha
que seduza
liberte instintos,
decapite
cada uma das serpentes
de sua cabeça
de Medusa


nascerá forte
de suas raízes mais íntimas
e femininas
o fundamental
respeito à liberdade e
e à vida


02 agosto 2015

A pulga e a sombra






Agonia crônica pousa na orelha e
pica atrás
deixando o dia inteiro vermelho
e cabisbaixo
um procuro e não me acho,
uma dor de cotovelo
outra dor quando me agacho.

porém ao observar a plenitude do Deus interior
que farfalha através do mais sutil odor
de flor aberta
às incríveis experiências sexuais da primavera
(delicadas cócegas em suas áreas
erógenas) que
deixarão a planta prenha,
carregada de si mesma
nutrida de sol de verão
em seus fluxos de seiva
viva
amadurecendo o sabor
sensual
da fruta,
entendo que a dor existe
o prazer existe
e passo através deles de século em século
no infinito autodescobrir-se
do próprio universo.

29 julho 2015

mensageiro do vento

fazer silêncio faz barulho
quando o pensamento muro
passa pela sua cabeça

Trivial

Oh, agora
lembrei que sou torta
de framboesa, amora
e cereja
observador vejo que seus vasos
sanguíneos não dão mais flor
vibro o lábio inferior
quando sinto
raiva misturada com
dor
agora me lembrei de que minhas mãos
são quentes e minha pele uma espécie
de pétala
que desgarrou
olhos escuros de não se ver dentro
olhos de outono
juntos
beijávamos o mesmo sunday sabor morango
ai, o amor
começou